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‘Jurassic World: Domínio’ abandona a ciência e dá lugar a piadas previsíveis

BRUNO CARMELO
FOLHAPRES – Desde que esta fábula sobre dinossauros chegou aos cinemas, ela teve como objetivo questionar os limites da nossa humanidade. Historicamente, humanos nunca conviveram com os seres jurássicos, mas a fantasia cinematográfica permite imaginar um mundo contemporâneo que abriga criaturas extintas há 65 milhões de anos.

Elas são muito maiores, mais fortes e ferozes do que nós. Mas para Hollywood, somos nós que as fechamos num parque, em primeiro lugar, e depois abrimos os portões para perambularem pelo mundo.
Em “Jurassic World: Domínio”, tiranossauros e giganotossauros caminham pela natureza, ocupando planícies mundo afora assim como leões e zebras. Mas eles foram criados por nós, e soltos de acordo com a vontade humana.

Se vivem nos cinco continentes, foi graças à iniciativa de empresários e lideranças nacionais. A saga de filmes iniciada por Steven Spielberg, em 1993, sempre refletiu nossa sede descontrolada pelo poder.

Em cada história, os homens e mulheres a..

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BRUNO CARMELO
FOLHAPRES – Desde que esta fábula sobre dinossauros chegou aos cinemas, ela teve como objetivo questionar os limites da nossa humanidade. Historicamente, humanos nunca conviveram com os seres jurássicos, mas a fantasia cinematográfica permite imaginar um mundo contemporâneo que abriga criaturas extintas há 65 milhões de anos.

Elas são muito maiores, mais fortes e ferozes do que nós. Mas para Hollywood, somos nós que as fechamos num parque, em primeiro lugar, e depois abrimos os portões para perambularem pelo mundo.
Em "Jurassic World: Domínio", tiranossauros e giganotossauros caminham pela natureza, ocupando planícies mundo afora assim como leões e zebras. Mas eles foram criados por nós, e soltos de acordo com a vontade humana.

Se vivem nos cinco continentes, foi graças à iniciativa de empresários e lideranças nacionais. A saga de filmes iniciada por Steven Spielberg, em 1993, sempre refletiu nossa sede descontrolada pelo poder.

Em cada história, os homens e mulheres arrogantes foram surpreendidos por suas criações, que romperam as grades e mataram dezenas de indivíduos pelo caminho. "Crie corvos e eles te comerão os olhos", diria o ditado.

Essa releitura de mitos como Frankenstein, em versão familiar e menos assustadora, repete ao espectador: a natureza é maior do que você, além de mais resiliente. Você desaparecerá enquanto espécie, mas o planeta continuará presente. Respeite o meio ambiente e aceite a sua insignificância.

Para além de conto ecológico, as produções miram os perigos de brincar de Deus. Sustenta-se um caráter tão progressista (o elogio da ciência) quanto conservador (ela deve agir de maneira limitada).

No filme mais recente, dirigido por Colin Trevorrow, não surpreende que o caráter perverso e abusivo provenha dos empresários bilionários, ao invés dos pequenos estudiosos de química, física e biologia, todos amantes dos bichos. Na introdução, Ellie Sattler (Laura Dern) faz carinho num dinossauro em cativeiro. Os CEOs desta aventura jamais fariam algo parecido.

Neste contexto, surpreende que "Jurassic World: Domínio" explore tão pouco, e timidamente, sua premissa. Este poderia ser o título mais ousado da franquia, ao supor a convivência cotidiana entre dinossauros e cidadãos.

Agora, os animais ferozes não chocam mais ninguém. Além disso, pesquisadores conseguiram clonar humanos e bichos, o que desperta a possibilidade de convivermos com criaturas desenvolvidas apenas em laboratório.

Entretanto, nenhum destes temas é explorado a contento. A cena dos trabalhadores de uma fábrica ao lado das feras ocupa poucos minutos iniciais. A existência de clones é mencionada como um não-evento, sem levantar qualquer hipótese para justificar a clonagem humana (quando a fantasia recua de sua trajetória rumo à ficção científica). Este filme repleto de pesquisadores e laboratórios demonstra interesse mínimo na ciência.

Pelo contrário, o que interessa aos produtores, desta vez, é a possibilidade de ver Owen Grady (Chris Pratt) e Claire Dearing (Bryce Dallas Howard) correndo desesperados de animais ferozes, se possível junto dos veteranos Ellie Sattler (Laura Dern), Alan Grant (Sam Neill) e Ian Malcolm (Jeff Goldblum).

Os estúdios aprenderam com os erros do passado: retiraram o salto alto que tanto incomodava nas corridas de Claire, e finalmente introduziram personagens negros importantes à trama (Mamoudou Athie e DeWanda Wise são excelentes). Mas retiraram o conflito, o conhecimento.

Agora, de nada adianta a experiência de Claire: ela nunca terá a oportunidade de utilizá-la. Grady, o "domador de dinossauros" e mestre do gesto tranquilizador face aos dinossauros, com a simples palma da mão estendida aos bichos, limita-se a um adestrador qualquer –amadores produzirão o mesmo efeito de pacificação de dinossauros mediante a palma estendida.

Ellie entende tudo sobre genética, e Sam, sobre paleontologia. Nenhum destes estudos servirá à narrativa. Face ao perigo, eles se transformam em meras vítimas tentando sobreviver.

Portanto, o filme dá um passo para frente, e outro para trás. Por um lado, evolui a trama, para esta que seria a conclusão da franquia (até os produtores decidirem criar um novo volume, ou série derivada).

Por outro lado, retira do centro do debate a moral, a ética e o descontrole das ambições humanas. Há muito mais espaço para piadas físicas, com personagens que tropeçam e caem, além de romances anunciados desde a primeira cena.

Não são apenas os dinossauros que se domesticam: o cinema também regride à compreensão de que agradar ao público amplo implica num teor previsível, conhecido, e um tanto inofensivo.JURASSIC WORLD: DOMÍNIO
Classificação 12 anos
Elenco Bryce Dallas Howard, Chris Pratt, Laura Dern, Jeff Goldblum
Produção EUA, 2022
Direção Colin Trevorrow
Avaliação Regular

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