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Raias invadem rio Tietê no interior de SP e acendem alerta

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Nos últimos anos, novos moradores passaram a ser vistos nos afluentes dos rios Paraná e Tietê, no interior de São Paulo. São as raias de água doce, mais especificamente espécies do gênero Potamotrygon.

Com seu formato de disco e corpo recoberto de bolinhas pretas e amarelas que lembram uma estampa de leopardo, esses peixes cartilaginosos, apesar de não serem exóticos, são considerados invasores -isto é, não ocorrem originalmente ali. Essa presença tem acendido um alerta em especialistas.

As raias (ou arraias, os dois são usados igualmente para esses peixes que, junto com os tubarões, formam os elasmobrânquios) possuem mais de 600 espécies no mundo, das quais cerca de 30 são de água doce e endêmicas da América do Sul.

Apesar da sua presença bem demarcada na região Amazônica e no Pantanal, sua distribuição ao sul era limitada abaixo da bacia do rio Paraguai, comum apenas na bacia do rio Prata, na Argentina.

Com a formação das barragens no rio Paraná, espe..

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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Nos últimos anos, novos moradores passaram a ser vistos nos afluentes dos rios Paraná e Tietê, no interior de São Paulo. São as raias de água doce, mais especificamente espécies do gênero Potamotrygon.

Com seu formato de disco e corpo recoberto de bolinhas pretas e amarelas que lembram uma estampa de leopardo, esses peixes cartilaginosos, apesar de não serem exóticos, são considerados invasores -isto é, não ocorrem originalmente ali. Essa presença tem acendido um alerta em especialistas.

As raias (ou arraias, os dois são usados igualmente para esses peixes que, junto com os tubarões, formam os elasmobrânquios) possuem mais de 600 espécies no mundo, das quais cerca de 30 são de água doce e endêmicas da América do Sul.

Apesar da sua presença bem demarcada na região Amazônica e no Pantanal, sua distribuição ao sul era limitada abaixo da bacia do rio Paraguai, comum apenas na bacia do rio Prata, na Argentina.

Com a formação das barragens no rio Paraná, especialmente para construção da Usina de Itaipu, levando à transposição da barreira natural de Sete Quedas, esses animais conseguiram subir o rio e já se espalham por quase todo o território do interior dos estados de São Paulo e Paraná.

Em cerca de 30 anos, os peixes já avançaram 140 quilômetros acima do Rio Tietê, uma velocidade extremamente rápida para animais com cerca de 1 metro de comprimento e que geralmente ficam na beira dos rios, sem percorrer longas distâncias.

O problema, segundo especialistas, é que as raias são animais peçonhentos e a sua presença em novos locais tem levado a um aumento de acidentes.

"A primeira vez que soube da presença de arraias no Paraná foi há 20 anos, no pontal do Paranapanema [afluente do rio Paraná], próximo ao município de Teodoro Sampaio, em São Paulo. Nesse tempo, elas subiram em uma velocidade inacreditável, e agora já há dados da presença delas no baixo do rio Tietê, em cidades como Três Lagoas e Itapura e, mais recentemente, Araçatuba e Buritama", explica o professor da Faculdade de Medicina da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Botucatu, Vidal Haddad Júnior.

Embora sejam consideradas pouco agressivas, os acidentes com as raias surgem quando são pisadas. Nesse momento, para se defenderem, elas usam suas caudas como se fosse um chicote. Elas têm também um ferrão repleto de veneno abaixo do rabo e costumam atingir principalmente pés e pernas.

Em sua pesquisa de doutorado na Unesp, a enfermeira Isleide Moreira documentou a invasão desses animais no interior do estado de São Paulo, chegando em áreas conhecidas como "prainhas", muito procuradas pelas populações locais como opção de lazer e turismo. O registro mais longevo que ela encontrou em sua análise foi em Buritama (a 531 km da capital).

Segundo a bióloga Patricia Charvet, da Universidade Federal do Ceará, as raias da família Potamotrygonidae (da qual fazem parte as espécies encontradas no Tietê) já são reconhecidas na região amazônica como uma das principais causas de afastamento por motivos de saúde dos pescadores.

"É importante destacar que a ferroada é um mecanismo de defesa desses animais. Elas vivem em geral enterradas em ambiente arenoso e não muito fundo, e é em situações assim que o acidente pode ocorrer, ou no momento de manuseio após a pesca", afirma.

Charvet ressalta que comunidades ribeirinhas na Amazônia e também na Argentina já possuem comportamento "adaptado" para as raias: os locais costumam entrar nos rios "arrastando" os pés no fundo, sem levantá-los, pois ao menor contato as raias costumam fugir.

Como é um tipo de acidente que não costuma ter registro, faltam dados oficiais no Brasil sobre lesões causadas por raias. De acordo com uma pesquisa da Universidade Estadual do Amazonas, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia e da Fundação da Saúde do Estado do Amazonas, publicada em 2018, a incidência de acidentes com raias naquela região é de 1,7 a cada 100 mil pessoas.

Segundo Haddad, a rápida expansão das arraias no Tietê também está relacionado com sua biologia. "São peixes vivíparos, ou seja, dão à luz a filhotes já formados. Como não tem predadores naturais, elas se espalharam de maneira muito rápida. Eu cheguei a coletar mais de 50 bichos em uma mesma manhã", diz.

O ictiólogo (especialista no estudo de peixes) e doutor em zoologia pela USP Thiago Loboda já realizou diversos estudos com as raias e explica que a ação humana nos rios Tietê e Paraná facilitou uma colonização natural do animal.

Para diminuir a ocorrência dos acidentes, o biólogo dá algumas dicas. "O momento de cuidado é ao entrar no rio ou descer de uma embarcação, pois é nessa hora que elas podem ferroar. Entrar correndo, espalhando água para todo lado, não é uma boa, pois elas vão se assustar", explica.

Um dos fatores que comprovam como essas espécies se adaptaram bem aos "novos ambientes" é que estudos genéticos de algumas populações têm mostrado que elas são estáveis, completa ele.

A bióloga e coordenadora do projeto Tubarões e Raias de Noronha, Bianca Rangel, ressalta que há muita preocupação com os acidentes que podem ocorrer no mar com os elasmobrânquios, mas pouca preocupação com casos na água doce.

"Diariamente ocorrem acidentes com raias em todos os rios, principalmente na região amazônica [por ser a maior área de distribuição das espécies], mas as pessoas nem ligam, tratam como se fosse um acidente comum", diz.

Ela afirma que o fato de os animais estarem lá deve agora ser encarado como algo natural, não devendo ser feito um controle. "É aquela velha briga de ambientalistas, no momento em que os empreendimentos são feitos não há uma avaliação a longo prazo dos efeitos que podem gerar [na natureza]. Agora que está feito, não temos como controlar, mas informar sobre o hábito de vida desses animais", afirma.

Segundo Haddad, programas de educação ambiental e conscientização já estão sendo feitos com os pescadores de Pereira Barreto, no baixo Tietê. "Para os pescadores, é um animal que antes eles não conheciam, e pode parecer estranho. O cuidado de conscientizar, mostrar como reagir, o que deve ser feito, isso é uma forma de reduzir os acidentes", diz.​

O QUE FAZER APÓS UM ACIDENTE COM RAIAS

– Em primeiro lugar, é importante sair da área e não tentar capturar o animal, evitando assim um segundo ataque
– Procurar assistência médica o mais rápido possível
– A água quente (mas não fervente) possui propriedades que quebram a proteína do veneno e aliviam a dor
– Não jogar nenhum líquido ou substância sem eficácia no local da ferida
– Não fazer torniquetes nem compressas de gelo
– Se necessário, o médico ou profissional de saúde pode receitar antibióticos devido à alta quantidade de bactérias que podem se proliferar no local da ferida

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